quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Lisboa

Lisboa, outono do ano 2000. Numa viagem com três amigos queridos, eu quis ficar um dia sozinho, para ir em busca do tempo perdido pelas ruas da cidade que tanto amo. Saí à procura de bares que frequentei com o grande amigo Melo e Castro: todos demolidos. Caminhei pela avenida da Liberdade (Salazar morreu e não a inaugurou!), alimentando o sonho de ver Esmeralda surgir na minha frente, com seu sorriso de jasmim-do-cabo. Em vão. Fui à rua do Malpique, onde no passado levei o maior susto da minha vida: um tremor de terra que sacudiu Lisboa, durante 45 segundos, em fevereiro de 1969. Já não era rua do Malpique. Procurei Dona Manuela, que me alugava um quarto naquela rua: estava dormindo profundamente, como no verso de Bandeira. Meio triste, continuei a minha caminhada e, à hora do almoço, entrei num restaurante na rua Eça de Queirós, nº 7. Pedi uma garrafa de vinho, escolhi o prato, voltei a pensar na minha vida em Lisboa, no final dos anos 1960, cheia de ilusões e surtos de paixão. Acabei de almoçar, já ia pedir a conta, quando vi se sentar numa mesa, a uns cinco metros de onde eu estava, uma mulher bela, belíssima, capaz de seduzir uma confraria de monges. Pedi outra garrafa de vinho e, discretamente, fiquei me extasiando com a mulher linda, linda , sobre quem choviam olhares. Quando percebi que ela estava terminando a refeição, paguei a conta e, encorajado pelo vinho, me aproximei. "Por favor, senhora, posso lhe dar uma informação?", eu disse. Um pouco assustada, ela disse que sim. E eu fui adiante: "Eu gostaria de lhe dizer que você é a mulher mais bela que vi em toda a minha vida." Ela agradeceu, eu saí. Fora do restaurante, afogueado, senti um toque nas minhas costas. me virei. Era a belíssima. Figuei tão confuso que balbuciei qualquer coisa, trêmulo, e me afastei quase correndo.
(Trecho de crônica de Nei Leandro de Castro, foto de Sandra Porteous)

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