quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Inconfidência

No bar, eu sinto
a angústia de Melmoth à espera do absinto
que não vem.
Falo ao garçom do aniversário de uma infanta
digo versos de O'Flahertie. Não adianta.
O garçom não vê ninguém.
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No bar, qualquer bar, fico à toa
a ver de longe uma malta de Pessoa´
que discute nonadas e poesia.
Valeu a pena o queijo fatiado?
Tudo vale a pena se o chope é gelado
e a alma vadia.
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No bar, uma turma de mentirosos terminais
fala da Abissínia, de abismos, de abissais
amores e paixões.
Arthur, o belo, já navegou um navio
bêbado e hoje seu maior desafio
é conquistar garções.
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No bar minha solidão é povoada
de uma legião barulhenta, atordoada
e quase feliz.
Ouço vozes, gritos, um palavrão: algavaria
e o allegro da Décima Sinfonia
do taciturno Luís.
**
Enfim, todo bar é multidão e solidão
em mim.
(Poema de Nei Leandro de Castro, in Diário Íntimo da Palavra. Foto de Sandra Porteous)

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