"E tudo vive em nós, herdeiros de gerações incontáveis e de culturas sucessivas."
(in Civilização e Cultura, Luis da Câmara Cascudo)
O rio e as ruas
Nei Leandro de Castro
O rio era profundo, às vezes com fortes correntezas, mas não há registro de um só afogamento em suas águas. Os meninos não tinham medo de se afogar. O medo maior era de um ataque de cações, que chegavam traiçoeiros e famintos pelas águas da maré cheia. Diziam que os cações tinham cheiro de melancia. No meio do rio, alguém gritava "Cheiro de melancia!", e o grito de alerta causava pânico em todos. O mistério dos cações e seu estranho e inexplicável cheiro nunca foi comprovado. Mesmo assim alguns meninos daquela geração deixaram de comer melancia pelo resto da vida.
O rio era uma ponta de um azul liquefeito. Alcançar o outro lado era desafio para os melhores nadadores. Mais fácil era pegar o barco a vela no cais Tavares de Lira e fazer uma viagem de quinze minutos até a Redinha. Travessia, travessias. As redes de pescar dos nativos da Redinha, quando não estavam colhendo peixes o mar, ficavam estendidas para colher as cores do pôr-do-sol e as primeiras luzes do alvorecer.
O rio Potengi guardava segredos seculares. No seu leito, de águas mornas, há mais de quatro séculos, um pirata francês chamado Jacques Riffault, depois de exercer a pirataria, enchia o seu barco de indiazinhas com suas "vergonhas rapadas". O francês era gentil e amoroso. As índias amavam aquele homem de fala engraçada e muita delicadeza.
(...)
(foto Sandra Porteous)
Um comentário:
Mais uma boa foto, Sandra. E o texto de Nei dispensa comentário. Um beijo.
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